A luta<br> e os que lutam
Sábado, 15 de Fevereiro. Neste dia participei em dois acontecimentos, de escalas diferentes, mas com importância pessoal significativa. Às duas marchei pela paz, contra à guerra, com milhares, em Bruxelas, num imenso formigueiro, da Gare du Nord à Gare du Midi. Às seis estive na apresentação do livro «O caminho das aves», em Bruxelas, também, na livraria portuguesa Orfeu. Livro de Casanova, escritor, autor, que bebi suavemente do dia 14 a 16.
Dois factos, que alguns poderão julgar dispersos, mas, para mim, profundamente interligados, com o presente que hoje vivemos e as manchas cinzas, negras, que nos assaltam o futuro, as quais precisamos pincelar de vermelho de luta e verde de esperança.
Vale a pena lutar
Se uma das personagens centrais do livro é a amizade, dirá, o autor, que a mensagem a passar é que vale a pena lutar. Pois valeu a pena lutar para os jovens actores deste livro, que forjando a amizade na resistência, decidiram-se pela luta aberta contra o regime fascista, numa época em que a luta trazia outras consequências em dor, sangue e repressão. Um grupo de jovens que lutou pelos seus sonhos, porque o sonho comanda a vida, por um mundo melhor, com encontro marcado em Portugal após a sua libertação das teias fascistas, numa data, 25 de Abril de 1974, que marca, também, a nível mundial, o fim de duas décadas de profunda libertação humana, do jugo colonial à liberdade sexual.
A relação do nós com o sistema, pode ser de «colaboração activa», de «luta aberta contra ele», «ou a sua aceitação passiva e comodista». A força dos que colaboram e o sustentam está naqueles que expectantes aceitam. «Sábio é aquele que se contenta com o espectáculo do mundo», dirá Ricardo Reis. Acho que não. A resignação do salve-se quem puder e a mordaça do medo, não é vida, é um silencioso desespero. A todos nos une um futuro melhor, para os nossos filhos e os deles. Pois «quem espera nunca alcança se esperar apenas, nós esperamos lutando, por isso a nossa espera é esperança e certeza».
Por isso, os milhares que se acotovelaram no centro de Bruxelas, foram mais que «uma perturbação nesta cidade adormecida sem sonhos, dormindo o sono parado de quem há muito adquiriu definitivos hábitos de espectador». Foi um sinal de esperança. Numa altura de regressões civilizacionais, em que os cães do sistema rufam os tambores da guerra, foram milhares, os actores, que não ficaram em casa, não alinhados, que participaram pela primeira vez numa manifestação, para dizer basta, para dizer não.
No dia 15 foi bom não termos ficado em casa, pois «é preciso malhar o ferro enquanto está quente». Os milhares que em Bruxelas disseram não à agressão dos EUA ao Iraque, juntaram a voz a outros milhões na Europa, no mundo, em centenas de cidades. Juntaram vozes aos milhares de trabalhadores portugueses que disseram não ao pacote laboral, que fizeram greve pela primeira vez, que à porta das fábricas lutam pelo seu posto de trabalho. O «regime» tremeu, teve medo. Vale a pena lutar.
A amizade é tudo
Mas o livro não é só sobre a luta, mas também sobre aqueles que lutam, lutaram e continuam a lutar. É sobre a amizade forjada na luta e na importância dos laços de solidariedade e fraternidade daqueles que lutam, a unidade. Pois «a amizade entre os companheiros de luta», é a «força maior que eles têm e sem a qual nunca se vencerá – a amizade é tudo».
Mensagem importante, pois apesar dos sinais de esperança, os tempos que correm são difíceis. São aqueles períodos de recuo histórico, onde o sistema ataca implacável, com os enormes meios que tem à sua disposição, onde a incerteza reina. Vivemos um período de crise, política, económica e social. Vivemos uma crise de valores. Estamos num período de rupturas e profundas contradições. De concertação e rivalidade, entre blocos capitalistas.
As dúvidas assaltam os que lutam, mas «para podermos avançar é indispensável termos dúvidas», «se queremos transformar o mundo temos de ser diferentes dos outros». E somos muitos os que, pela mobilização buscamos respostas, nos diversos continentes, para o caminho que juntos vamos percorrer. O desgaste é grande, mas «não há nada melhor do que chegarmos ao fim de um período mau e vermos que fomos capazes de resistir e aguentar». De lutar, sempre. Mas não sozinhos. «Nós temos a felicidade», responde no livro Francisco a Abílio, «de dispor de um espaço colectivo de luta, de não estarmos condenados a procurar sozinhos, individualmente, os caminhos do futuro». Este nosso espaço, esta força organizada, este espaço de luta, que noutros lado falta. O Partido, por ser o Partido diferente. O Partido Comunista Português.